Nessa coluna, eu trago a vocês depoimentos daqueles que, de uma maneira ou de outra, se transformaram em “profissionais” do cosplay. Para alguns, foi uma atividade paralela, uma forma, muitas vezes, de custear os próprios trajes. Para outros, uma segunda vida fazendo aquilo que mais amam. Para outros, ainda, uma profissão à qual se dedicam noite e dia.

Jaqueline Abrão é uma cosplayer com um currículo de dar inveja a qualquer um. Promotora de eventos, já atuou em alguns dos encontros mais prestigiosos do país. Na nossa conversa, ela me contou o trabalho de jurada de concursos, o impacto da Comic Con para a cena geek brasileira, a importância de um bom fotógrafo e muito mais.

Confiram a entrevista abaixo:

Qual é a sua idade e há quanto tempo trabalha com cosplay?

Eu tenho 26 anos, faço cosplay a quatro anos, porém como promotora de eventos só iniciei os trabalhos com cosplay após dois anos de experiência na área.

Que trabalhos você já realizou como cosplayer? O que a levou a fazê-los?

A procura das empresas em fazer um evento com diferencial me levou a tornar um hobby cosplay como uma fonte de trabalho, até mesmo porque os figurinos são caros e sem esse dinheiro não seria possível produzir metade dos projetos que eu tenho hoje.

Apresento uma breve relação da minha experiência como promotora de alguns eventos  renomados na área:

Comic Con Experience – Empresa: Hasbro Brinquedos

Brasil Game Show – Empresa: Get Ready

DC Comics Super Hero World Record Event – Empresa: Warner Bros

Feira ExpoMusic – Empresa: Weeplay

Anime Friends – Empresa: Lubss

Comic Con Estandes e Network – Empresa: Omelete

Semana Cosplay – Empresa: Bourbon Atibaia Convention & Spa Resort

AGE PRIME – Empresa: Cooler Master Brasil 

Que tipo de publicidade você faz para o seu trabalho? Que plataformas você usa? Quanto do seu tempo e energia você dedica a isso?

Procuro sempre utilizar a publicidade do Facebook , Instagram e Youtube para promover o meu trabalho. Também é necessário na minha área uma parceria com fotografo que possa produzir boas fotos para portfólio.

Eu dedico quase todos os dias de semana para produção dos figurinos e, no final de semana, tento recuperar os gastos com jobs relacionados ao universo geek.

jack 4.jpg

Créditos: Eduardo Portas

Você já fez algum trabalho relacionado a cosplay fora do mundo “nerd” propriamente dito? (eventos corporativos, festas infantis, filantropia, ações promocionais?)

Já trabalhei para eventos relacionados a Direito, Música, Festa infantil e área de Estética e Beleza.

Você tem interesse em se engajar em algum tipo de trabalho com cosplay que ainda não fez? Quais são seus horizontes?

Gostaria de viajar para fora do país para conhecer outras culturas/eventos e outras técnicas de produção, quem sabe um dia…

Meus sonhos são grandes, mas infelizmente nessa área você só consegue destaque quando é bilíngue e sabe se promover muito bem. Contatos são fundamentais, então ainda tenho um longo caminho até conseguir alcançar esse objetivo.

Num editorial recente, a Hayley Williams do Kotaku disse que trabalhos remunerados de cosplay em convenções são minados por cosplayers dispostos a trabalhar de graça, assim como pela mentalidade de que cosplay deve ser feito por amor, não por dinheiro. Você concorda com esse diagnóstico? Se sim, você vê alguma solução?

Acredito que tudo vai do foco da pessoa. Se a pessoa mora no interior como é meu caso, estar em um evento sem fins lucrativos em uma cidade grande como São Paulo ou Rio de Janeiro, por exemplo, acaba afetando muito o financeiro da pessoa, então a ajuda de custo do evento com alimentação, transporte e hospedagem é uma moeda de troca para cosplayers poderem estar lá sem prejuízo financeiro.

Existem cosplayers famosos que cobram cachê, e francamente eu não vejo problema algum nisso já que todos nós temos gastos e muito trabalho com a produção do projeto. Seja venda de prints ou trabalho remunerado, vai da sua criatividade saber o que é melhor e justo.

Para além da realização pessoal, o que uma cosplayer busca em concursos? (Renda, prestígio, networking?) Você participa de muitos concursos? É possível se profissionalizar no âmbito do cosplay sem participar de concursos?

Existe uma variação enorme de tribos cosplay, pois como é um hobby varia muito de pessoa pra pessoa. Existe cosplayer que prefere apenas ser modelo fotográfico, outros que gostam do desafio de estar em um palco e interpretar o personagem, outros para quem apenas estar no evento com amigos e se divertir já é suficiente e existe até quem gosta de produzir os acessórios e figurinos, mas só vende o cosplay.

Creio que o sol nasceu para todos, e independente da meta que o cosplayer tem no final o feedback positivo do mesmo é oque importa, pode ser o cosplay mais simples do mundo, todos sem exceção gostam de elogios sobre seu projeto e ter reconhecimento muitas vezes é o que nos motiva a continuar inovando e criando.

jack 2.jpg

Como, exatamente, funciona o trabalho dos jurados de concursos? Como eles são escolhidos? As diretrizes para avaliação de cosplayers variam de evento para evento, ou existem linhas gerais que são seguidas por todos? Quão formalizadas são as normas de avaliação?

Jurados são selecionados de acordo com a sua especialidade, eu, por exemplo, sou formada como maquiadora profissional, então muitas vezes quando me convidam é exatamente por terem conhecimento de que eu já trabalho com essa área e também produzo maior parte dos meus figurinos principalmente de competição, então tenho conhecimento vasto sobre vários tipos de material.

As diretrizes variam de evento pra evento. Existe normalmente um regulamento do evento que é enviado para jurado antes do concurso, assim podemos observar com calma como serão os critérios de avaliação seguindo padrões do tempo, espaço e conceito do evento. A linha geral de qualquer concurso é referência em foto do personagem, pose no palco para jurado e plateia e a sua interpretação.

A comunidade brasileira de cosplay periodicamente se mobiliza contra queixas de que concursos e veículos midiáticos estariam estimulando hierarquias no hobby. Segundo essa visão, alguns tipos de cosplay (sobretudo os envolvendo armaduras) são mais premiados e recebem uma cobertura maior da mídia do que outros. Você concorda com isso? Você acredita que cosplayers possam estar planejando seus trajes e performances de acordo, para maximizar sua visibilidade?

Creio que os cosplays que estão na área para campeonato pensam minuciosamente em cada detalhe do cosplay, e claro independe do cosplay ser de armadura ou não. O que conta é a complexidade do figurino, o acabamento, os detalhes do mesmo. Ou seja, creio que visibilidade do traje nada mais é que o resultado de um bom trabalho, independente do material escolhido.

Cosplays frequentemente são mencionados em discussões sobre direitos autorais. Em tese, character designs são propriedade de seus respectivos estúdios/editoras, e qualquer lucro sobre eles é vetado a terceiros. Você já teve ou testemunhou algum problema em relação a isso? Você acredita que isso seja um fator limitante para o crescimento da profissão?

Já presenciei problemas do tipo com colegas. As empresas que são licenciadas ou oficiais acabam ficando com receio de uma pessoa sem treinamento acabar relacionando e vinculando uma imagem de um personagem deles sem autorização.

Existe um critério minucioso da empresa para projetos com princesas ou personagens marcante de filmes, então quando trabalhamos em um evento grande infelizmente escolhemos o cosplay a dedo para o stand, pois o direito autoral da marca existe pra isso.

Eu acredito que se você vai fazer uso desse cosplay como hobby não vejo problema algum, agora se você vai usar para fins lucrativos ai a coisa é mais complicada. Tudo varia do ambiente onde você usa ele.

jack 3

Créditos: Danilo Marroni

Como você vê o futuro profissional do cosplay? Você acredita que o meio esteja aumentando ou diminuindo?

Creio que a cada ano a indústria de personagens vivos sempre cresce. O evento da Comic Con trouxe uma grande quantidade de fã reunidos que acabou gerando novos olhares sobre o conceito cosplay. Muitos trabalhos freelance, também, são executados nos dias de hoje em outros eventos e festas e isso é maravilhoso. Espero que um dia as pessoas possam viver apenas do cosplay, isso seria um sonho.

A maioria dos cosplayers usa pseudônimos. Você pode me falar um pouco sobre este hábito? Você sabe qual é a origem da prática?

Alguns praticantes do hobby gostam de separar o seu nome artístico do seu nome real, pois isso evita que eles percam a sua privacidade. A origem do Cosplay é a junção das palavras costume [traje, fantasia] e roleplay [brincadeira, interpretação] , então as pessoas podem utilizar de qualquer nome criativo para expressar a sua identidade artística.

Eu, particularmente, não sou a melhor pessoa para falar sobre esse assunto, pois meu nome artístico é na verdade meu nome real. Particularmente, eu gosto que as pessoas me chamem pelo meu nome quando me encontram nos eventos, acho que se torna uma ponte mais próxima de relação entre eu e a pessoa que me segue na rede social.

E você? Trabalha ou trabalhou com cosplay e tem uma história interessante para contar? Entre em contato com a página